sábado, dezembro 27, 2008




Receita de Ano Novo


Carlos Drummond de Andrade




Para você ganhar belíssimo Ano Novo



cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,



Ano Novo sem comparação como todo o tempo já vivido



(mal vivido ou talvez sem sentido)



para você ganhar um ano



não apenas pintado de novo,



remendado às carreiras,



mas novo nas sementinhas do vir-a-ser,



novo até no coração das coisas menos percebidas



(a começar pelo seu interior)



novo espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,



mas com ele se come, se passeia,



se ama, se compreende, se trabalha,



você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,



não precisa expedir nem receber mensagens



(planta recebe mensagens?passa telegramas?).



Não precisa fazer lista de boas intenções



para arquivá-las na gaveta.



Não precisa chorar de arrependido



pelas besteiras consumadas



nem parvamente acreditarque por decreto da esperança



a partir de janeiro as coisas mudem



e seja tudo claridade, recompensa,



justiça entre os homens e as nações,



liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,



direitos respeitados, começando



pelo direito augusto de viver.



Para ganhar um ano-novo



que mereça este nome,



você, meu caro, tem de merecê-lo,



tem de fazê-lo de novo,



eu sei que não é fácil,



mas tente, experimente, consciente.



É dentro de você que o Ano Novo



cochila e espera desde sempre.

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