segunda-feira, março 30, 2009



História de um Pão


Por Irmão X



Quando Barsabás, o tirano, demandou o reino da morte, buscou debalde reintegrar-se no grande palácio que lhe servira de residência.



A viúva, alegando infinita mágoa, desfizera-se da moradia, vendendo-Ihe os adornos.



Viu ele, então, baixelas e candelabros, telas e jarrões, tapetes e perfumes, jóias e relíquias, sob o martelo do leiloeiro, enquanto os filhos querelavam no tribunal, disputando a melhor parte da herança.



Ninguém lhe lembrava o nome, desde que não fosse para reclamar o ouro e a prata que doara a mordomos distintos.



E porque na memória de semelhantes amigos ele não passava, agora, de sombra, tentou o interesse afetivo de companheiros outros da infância...



Todavia, entre eles encontrou simplesmente a recordação dos próprios atos de malquerença e de usura.



Barsabás, entregou-se as lágrimas de tal modo, que a sombra lhe embargou, por fim, a visão, arrojando-o nas trevas.



Vagueou por muito tempo no nevoeiro, entre vozes acusadoras, até que um dia aprendeu a pedir na oração, e, como se a rogativa lhe servisse de bússola, embora caminhasse às escuras, eis que, de súbito, se lhe extingue a cegueira e ele vê, diante de seus passos, um santuário sublime, faiscante de luzes.



Milhões de estrelas e pétalas fulgurantes povoavam-no em todas as direções.



Barsabás, sem perceber, alcançara a Casa das Preces de Louvor, nas faixas inferiores do firmamento.



Não obstante deslumbrado, chorou, impulsivo, ante o Ministro espiritual que velava no pórtico.



Após ouvi-lo, generoso, o funcionário angélico falou sereno:



- Barsabás, cada fragmento luminoso que contemplas é uma prece de gratidão que subiu da Terra ...



- Ai de mim - soluçou o desventurado - eu jamais fiz o bem...



- Em verdade - prosseguiu a informante -, trazes contigo, em grandes sinais, a pranto e a sangue dos doentes e das viúvas, dos velhinhos e órfãos indefesos que despojaste, nos teus dias de invigilância e de crueldade; entretanto, tens aqui, em teu crédito, uma oração de louvor...



E apontou-lhe acanhada estrela, que brilhava a feição de pequenino disco solar.- Há trinta e dois anos - disse, ainda, o instrutor -, deste um pão a uma criança e essa criança te agradeceu, em prece ao Senhor da Vida.



Chorando de alegria e consultando velhas lembranças, Barsabás perguntou:



- Jonakim, o enjeitado?



- Sim, ele mesmo - confirmou a missionário divino.



- Segue a claridade do pão que deste, um dia, por amor, e livrar-te-ás, em definitivo, do sofrimento nas trevas.



E Barsabás acompanhou a tênue raio do tênue fulgor que se desprendia daquela gota estelar, mas, em vez de elevar-se as Alturas, encontrou-se numa carpintaria humilde da própria Terra.



Um homem calejado aí refletia, manobrando a enxó em pesado lenho...



Era Jonakim, aos quarenta de idade.



Coma se estivessem as dois identificados no doce fio de luz, Barsabás abraçou-se a ele, qual viajante abatido, de volta ao calor do lar...



(...)Decorrido um ano, Jonakim, a carpinteiro, ostentava, sorridente, nos braços, mais um filhinho, cujos louros cabelos emolduravam belos olhos azuis.



Com a benção de um pão dado a um menino triste, por espírito de amor puro, conquistara Barsabás, nas Leis Eternas, o prêmio de renascer para redimir-se.



Xavier, Francisco Cândido. Da obra: O Espírito da Verdade. Ditado pelo Espírito Irmão X. 3 edição. Rio de Janeiro, RJ: FEB. 1977.