O casamento numa perspectiva espírita
Astolfo O. de Oliveira Filho
O Espiritismo nos ensina que o casamento foi um avanço na
história da Humanidade e sua abolição seria um retrocesso que poria o homem
abaixo mesmo de certos animais
Não há, em todo o direito privado, instituto mais discutido
que o casamento.
LINTON o define como sendo a união socialmente reconhecida
entre pessoas de sexo diferente.
LAURENT o chama de "fundamento da
sociedade, base da moralidade pública e privada".
GOETHE entende
que o matrimônio é a base e o coroamento de toda cultura e LESSING diz ser o
casamento "a grande escola fundada pelo próprio Deus para a educação do
gênero humano", havendo, no entanto, entre filósofos e literatos os seus
detratores, como SCHOPENHAUER que afirmou que "em nosso hemisfério
monógamo, casar é perder metade de seus direitos e duplicar seus deveres".
É conhecido no anedotário nacional o
ditado que equipara o casamento a uma fórmula matemática:
uma soma de
preocupações, uma subtração da liberdade, uma multiplicação de filhos e uma
divisão de bens.
No campo do direito civil, conceitua-se o matrimônio como a
união permanente entre o homem e a mulher, de acordo com a lei, a fim de se
reproduzirem, de se ajudarem mutuamente e de criarem os seus filhos.
Historicamente, o casamento começou a receber atenção na
Roma antiga, onde se achava perfeitamente organizado.
Inicialmente havia a
confarreatio, casamento da classe patrícia, correspondendo ao casamento
religioso.
Dentre outros traços, caracterizava-se pela oferta aos deuses de um
pão de trigo, costume que, modificado, sobrevive até os nossos dias, com o
tradicional bolo de noiva.
A confarreatio não tardou a cair em desuso e era
rara já ao tempo de Augusto.
A coemptio era o matrimônio da plebe, constituindo
o casamento civil.
Finalmente, havia o usus, aquisição da mulher pela posse,
equivalendo assim a uma espécie de usucapião.
O casamento religioso só foi
regulamentado pela Igreja no Concílio de Trento (1545-1563).
Com o tempo, em
virtude de inúmeros fatores, inclusive a Reforma protestante, os Estados
puseram à margem o casamento religioso e o primeiro país a dar esse passo foi a
Inglaterra, ao tempo de Cromwell.
Aspectos jurídicos do casamento
Historicamente, pode-se dizer que quatro formas fundamentais
de casamento existiram no mundo:
1) casamento por rapto ou captura, muito comum
entre as tribos que guerreavam entre si e nas civilizações antigas, embora
MALINOWSKI entenda que esse tipo de casamento tenha existido mais na teoria do
que na prática;
2) casamento por compra ou troca, comum entre os zulus da
África, os índios americanos e os germanos;
3) casamento por determinação
paterna, cultivado sobretudo pelos povos islâmicos e na China e, por fim,
4)
casamento por consentimento mútuo, em que é dispensável a autorização dos pais,
salvo se os contraentes forem menores.
ROUAST entende que o matrimônio é ato complexo, ao mesmo
tempo contrato e instituição.
Claro que ele é mais que um contrato, mas não
deixa de ser também um contrato. No Brasil, somente em 11/9/1861 foi regulado
por Lei o casamento dos acatólicos, que poderia celebrar-se segundo o rito
religioso dos próprios nubentes.
Mas foi somente com a proclamação da República
que o casamento perderia seu caráter confessional, instituindo-se no país, em
24/1/1890, com o Decreto no 181, o casamento civil[...].
Visão espírita do casamento
ALLAN KARDEC propôs aos Espíritos a seguinte questão:
-
"Será contrário à lei da Natureza o casamento?"
Eles responderam:
"É um progresso na marcha da Humanidade".
Sua abolição seria regredir
à infância da Humanidade e colocaria o homem abaixo mesmo de certos animais que
lhe dão o exemplo de uniões constantes.
Em outro item do mesmo livro Kardec
anotou:
"A poligamia é lei humana cuja abolição marca um progresso social.
O casamento, segundo as vistas de Deus, tem que se fundar na afeição dos seres
que se unem.
Na poligamia não há afeição real: há apenas sensualidade" (O
Livro dos Espíritos, 695, 696 e 701).
Segundo os Espíritos, há no homem alguma coisa mais, além
das necessidades físicas: há a necessidade de progredir.
"Os laços sociais
são necessários ao progresso e os de família mais apertados tornam os
primeiros. Eis por que os segundos constituem uma lei da Natureza.
Quis Deus
que, por essa forma, os homens aprendessem a amar-se como irmãos."
O
relaxamento dos laços de família traria como resultado a recrudescência do
egoísmo (cf. O Livro dos Espíritos, 774 e 775).
ALLAN KARDEC,
examinando o tema em outra obra, assim escreveu:
"Na união dos
sexos, de par com a lei material e divina, comum a todos os seres viventes, há
outra lei divina, imutável como todas as leis de Deus, exclusivamente moral - a
Lei do amor.
Quis Deus que os seres se unissem, não só pelos laços carnais,
como pelos da alma, a fim de que a afeição mútua dos esposos se transmitisse
aos filhos, e que fossem dois, em vez de um, a amá-los, cuidar deles e
auxiliá-los no progresso" (O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. 22,
item 3).
Planejamento espiritual da família
No estado errante, o Espírito mesmo "escolhe o gênero
de provas que deseja sofrer; nisto consiste o seu livre arbítrio" (O Livro
dos Espíritos, 258, 851 e 866).
O acaso, propriamente considerado, não pode
entrar nas cogitações do sincero discípulo do Evangelho (Emmanuel, O
Consolador, pergunta 186).
Observe-se, entretanto, que o Espírito escolhe
"o gênero de provas"; os detalhes são conseqüência da posição
escolhida e freqüentemente de suas próprias ações.
"Somente os grandes
acontecimentos, que influem no destino, estão previstos" (O Livro dos
Espíritos, 259).
Além disso há duas clássicas exceções à regra geral de escolha
das provas:
1) quando o Espírito é simples, ignorante e sem experiência,
"Deus supre a sua inexperiência, traçando-lhe o caminho que deve
seguir" (O Livro dos Espíritos, 262).
2) quando possuído pela má vontade
ou sendo ainda muito atrasado, Deus pode impor-lhe uma existência que sabe lhe
será útil ao progresso; mas "Deus sabe esperar: não precipita a
expiação" (O Livro dos Espíritos, 262-A e 337).
A dúvida relativamente à planificação espiritual do
casamento pode ser desfeita com os ensinamentos seguintes, transmitidos por
EMMANUEL, que foi mentor espiritual da obra de Francisco Cândido Xavier:
1.) Habitualmente somos nós mesmos quem planifica a formação
da família, antes do renascimento terrestre, com o amparo e a supervisão dos
instrutores beneméritos.
Comumente chamamos a nós antigos companheiros de
aventuras infelizes, programando-lhes a volta em nosso convívio, a prometer-lhes
socorro e oportunidade, em que se lhes reedifique a esperança de elevação e
resgate, burilamento e melhoria.
De todos os institutos sociais existentes na
Terra, a família é o mais importante, do ponto de vista dos alicerces morais
que regem a vida (Emmanuel, Vida e Sexo, cap. 17).
*
2.) O colégio familiar tem suas origens sagradas na esfera
espiritual.
Em seus laços, reúnem-se todos aqueles que se comprometeram, no
Além, a desenvolver na Terra uma tarefa construtiva de fraternidade real e
definitiva (Emmanuel, O Consolador, pergunta 175).
*
3.) O matrimônio na Terra é sempre uma resultante de
determinadas resoluções tomadas na vida do Infinito, antes da reencarnação dos
Espíritos, razão pela qual os consórcios humanos estão previstos na existência
dos indivíduos, no quadro escuro das provas expiatórias ou no acervo de valores
das missões que regeneram e santificam (Emmanuel, O Consolador, pergunta 179).
E para que possam bem cumprir seus deveres, faz-se mister a mais entranhada fé
em Deus, visto que na prece e na vigilância espiritual encontrarão sempre as
melhores defesas (Emmanuel, O Consolador, pergunta 188).
*
4.) Quase sempre, Espíritos vinculados ao casal
interessam-se na Vida Maior pela constituição da família, à face das próprias
necessidades de aprimoramento e resgate, progresso e autocorrigenda.
Em vista
disso, cooperam, em ação decisiva, na aproximação dos futuros pais, aportando
em casa, pelos processos da gravidez e do berço, reclamando naturalmente a
quota de carinho e atenção que lhes é devida (Emmanuel, Vida e Sexo, cap. 11).
*
Tipos de casamento existentes na Terra
Diz-nos ANDRÉ LUIZ que quatro são os tipos de casamento na
Terra:
há uniões marcadas pelo amor;
há casamentos em que a fraternidade é o
sentimento dominante;
existem uniões de provação e há, por fim, os casamentos
criados pelo dever.
O matrimônio espiritual realiza-se alma com alma.
"Os
demais representam simples conciliações para a solução de processos
retificadores" ("Nosso Lar", obra psicografada por Francisco
Cândido Xavier, cap. 38, pág. 212).
Ainda no mesmo livro, o autor transmite-nos a informação de
que "na fase atual evolutiva do planeta, existem na esfera carnal
raríssimas uniões de almas gêmeas, reduzidos matrimônios de almas irmãs ou
afins, e esmagadora porcentagem de ligações de resgate.
O maior número de
casais humanos é constituído de verdadeiros forçados, sob algemas"
("Nosso Lar", cap. 20, pág. 113).
E foi por essa ocasião que ANDRÉ LUIZ tomou conhecimento da
experiência de seu amigo Lísias, que se noivou no plano espiritual, preparando
seu retorno à Terra, em nova encarnação.
Ele ignorava até então que as bases do
casamento terrestre se encontram na vida espiritual, mas sua maior surpresa foi
saber que Lísias e sua noiva já haviam acumulado vários fracassos na
experiência do matrimônio na Terra, em virtude da imprevidência e da falta de
autodomínio, razões de sua perdição no pretérito.
OLIVEIRA FILHO, Astolfo O. O Consolador. Disponível em http://www.oconsolador.com.br/ano2/63/especial.html
. Acesso: 16 NOV. 2014.
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