sábado, novembro 26, 2016

Mensagem da árvore - Eros






Mensagem da árvore

Eros


O aprendiz da vida sentia-se cansado.


Em toda parte havia experimentado a incompreensão alheia e a dor se lhe agasalhava na alma.


Pelos caminhos percorridos suportara as dificuldades, padecendo pedradas morais e sarcasmos.


Se sorria, era tido por tolo; quando se recolhia à meditação, era apontado como alienado.


Os dias constituíam-lhe desafios difíceis e as noites se transformavam em períodos insones de amargas reflexões.


As aparentes alegrias, quais rosas exuberantes, ocultavam espinhos que o picavam.


Foi numa dessas reflexões angustiosas, que se deu conta das próprias dores e planejou desistir...


Atraído por uma árvore frondosa e bela, recolheu-se à sua sombra e, porque se sentisse vencido, pensou em dar cabo da própria vida.


Enquanto planejava o desatino, pareceu escutar a voz da árvore altaneira, que lhe disse:


“ - Amigo, ouve-me! 


À tua semelhança, cresci suportando dificuldades. 


Quando era frágil temi morrer mil vezes, esmagada ou arrancada, sem vitalidade nem confiança no futuro.


A vida, que em mim pulsava, lentamente enrijou-me o lenho, fazendo-me dobrá-lo quando rugiam as tormentas, a fim de não sucumbir, logo refazendo a postura e insistindo com coragem.


O desdobrar dos ramos atraiu aves que se aninharam em meus braços buscando amparo.


Vendavais inesperados feriram-me,arrancando-me galhos e ameaçando-me o tronco.


Raios perigosos caíram próximos de mim, abalando-me profundamente até às raízes.


Quando comecei a florir e frutescer, desocupados apedrejaram-me sem consideração nem piedade, numa fúria cruel.


O sol queimou-me por longos períodos e a chuva encharcou-me vezes sem conto...


Passada cada estação recompunha-me sem desânimo, confiando na vida.


Partes de mim foram retiradas e hoje adornam vários lares.


Dilaceraram-me com machados afiados, serras elétricas, plainas e pequenos canivetes abrem-me letras que cicatrizam no meu tronco...


É possível que, um dia, arranquem-me daqui e me transformem em tábuas ou vigas fortes e os meus ramos frágeis se tornem combustíveis. 


Eu, todavia, esperarei, confiando na vida e tudo fazendo para prosseguir até que termine o meu ciclo e retorne ao solo amigo, donde emergi, sabendo que as minhas sementes permanecerão repetindo a minha experiência por tempos sem fim.


Medita, amigo, e bendize as tuas dilacerações, prosseguindo até o momento em que a libertação natural te chegue e te faça voar nas asas do vento, no rumo do infinito.”


O homem, que invejava a árvore e queria utilizá-la para destruir o corpo, meditou, sorriu, agradeceu a mensagem oportuna e retomando o ânimo, saiu confiante, seguindo adiante, sem mais reclamar.




FRANCO, Divaldo Pereira pelo Espírito Eros. Do livro Em algum lugar do futuro, 2.ed, 1987, p. 07-08.

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