domingo, maio 12, 2024

Minha Mãe - Vinícius de Moraes

 



Minha Mãe 


Vinícius de Moraes



Minha mãe, minha mãe, eu tenho medo

Tenho medo da vida, minha mãe.

Canta a doce cantiga que cantavas

Quando eu corria doido ao teu regaço

Com medo dos fantasmas do telhado.

Nina o meu sono cheio de inquietude

Batendo de levinho no meu braço

Que estou com muito medo, minha mãe.

Repousa a luz amiga dos teus olhos

Nos meus olhos sem luz e sem repouso

Dize à dor que me espera eternamente

Para ir embora. Expulsa a angústia imensa

Do meu ser que não quer e que não pode

Dá-me um beijo na fronte dolorida

Que ela arde de febre, minha mãe.

 

*


Aninha-me em teu colo como outrora

Dize-me bem baixo assim: — Filho, não temas

Dorme em sossego, que tua mãe não dorme.

Dorme. Os que de há muito te esperavam

Cansados já se foram para longe.

Perto de ti está tua mãezinha

Teu irmão, que o estudo adormeceu

Tuas irmãs pisando de levinho

Para não despertar o sono teu.

Dorme, meu filho, dorme no meu peito

Sonha a felicidade. Velo eu.

 

*


Minha mãe, minha mãe, eu tenho medo

Me apavora a renúncia. Dize que eu fique

Dize que eu parta, ó mãe, para a saudade.

Afugenta este espaço que me prende

Afugenta o infinito que me chama

Que eu estou com muito medo, minha mãe.


 

FONTE

 

VINICIUSDEMORAES. Minha mãeRio de Janeiro , 1933.Disponível em https://www.viniciusdemoraes.com.br/pt-br/poesia/poesias-avulsas/minha-mae. Acesso 12 MAIO, 2024.

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