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segunda-feira, dezembro 19, 2011

Uma História de Natal - Paulo Coelho


Uma História de Natal

Paulo Coelho



Conta uma antiga e conhecida lenda, cuja origem não pude verificar, que uma semana antes do Natal o Arcanjo Miguel pediu que seus anjos visitassem a Terra; desejava saber se estava tudo pronto para a celebração do nascimento de Jesus Cristo.


Enviou-os em duplas, sempre um anjo mais velho com um mais jovem, de modo que pudesse ter uma opinião mais completa do que ocorria na Cristandade.


Uma destas duplas foi designada para o Brasil,e terminou chegando tarde da noite.


Como não tinham onde dormir, pediram abrigo numa das grandes mansões  que podem ser vistas em certos lugares  do Rio de Janeiro.


O dono da casa, um nobre à beira da falência (o que, aliás, acontece com muita gente que habita aquela cidade), era católico fervoroso, e logo reconheceu os enviados celestiais, por suas auréolas douradas na cabeça.


Mas estava muito ocupado, preparando uma grande festa para celebrar o Natal, e não queria desarrubar  a decoração quase terminada: pediu que fossem dormir no porão.


Embora os cartões de Boas Festas sejam sempre ilustrados com neve caindo, a data no Brasil cai em pleno verão; no lugar para onde os anjos foram enviados fazia um calor terrível, e o ar  - cheio de humidade - era quase irrespirável.


Deitaram-se em um piso duro, mas antes de começar suas orações, o anjo mais velho notou uma rachadura na parede.


Levantou-se, consertou-a usando os seus poderes divinos, e voltou para prece noturna.


Passaram a noite como se estivessem no inferno, tão quente que estava.


Dormiram muito mal, mas precisavam cumprir a missão que lhes fora confiada por Deus.


No dia seguinte, percorreram a grande cidade - com seus 12 milhões de habitantes, suas praias e montanhas, seus contrastes,suas paisagens belas e seus recantos horríveis.


Preencheram relatórios, e quando a noite  tornou a cair, comecaram a viajar para o interior do país.


Mas, confundidos pela diferença de hora, de novo se encontraram sem lugar para dormir.


Bateram à porta de uma casa humilde, onde um casal veio atende-los.


Por não terem acesso às gravuras medievais que retraram os mensageiros de Deus, não reconheceram os dois peregrinos - mas se estavam precisando de abrigo,  a casa era deles.


Prepararam um jantar, apresentaram o pequeno bebê recem-nascido, e ofereceram o próprio quarto, pedindodesculpas porque eram pobres, o calor era grande, mas não tinham dinheiro para comprar um aparelho de ar condicionado.


Quando acordaram no dia seguinte,encontraram o casal banhado em lágrimas.


O único bem que possuiam, uma vaca que dava leite, queijo, e sustento para a família, havia aparecido morta no campo.


Despediram-se dos peregrinos, envergonhados porque não podiam preparar um café da manhã.


Enquanto andavam pela estrada de barro, o anjo mais jovem demostrou sua revolta:


- Não posso entender tal maneira de agir!


O primeiro homem tinha tudo o que precisava, e ainda assim você o ajudou.


Quanto a este pobre casal, que nos recebeu tão bem, voce não fez nada para aliviar o sofrimento deles!

- As coisas não são o que parecem - disse o anjo mais velho.

- Quando estavamos naquele porão horrível, notei que havia muito ouro armazenado na parede daquela mansão, deixado ali por um antigo proprietário.


A rachadura estava expondo parte do tesouro, e resolvi esconde-lo de novo, porque o dono da casa não sabia ajudar quem precisava.



"Ontem, enquanto dormíamos na cama que o casal nos oferecera, notei que um terceiro convidado havia chegado: o anjo da morte.


Fora enviado para levar a criança,mas como eu o conheço há muitos anos,convenci que tirasse a vida da vaca, em seu lugar."


"Lembre-se do dia que está prestes a ser comemorado: como as pessoas  dão muito valor à aparência, ninguém quis receber Maria.


Mas os pastores a acolheram,  e por causa disso, tiveram a graça de serem os primeiros a contemplar o sorriso do Salvador do Mundo."



 FONTE:

“Guerreiro da Luz Online". Disponível em   www.paulocoelho.com.br. Acesso: 19 DEZ 2011.

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