Allan
Kardec
Homenagem
pelos 213 anos de Nascimento
Nascido
em Lyon, a 3 de outubro de 1804, de uma família antiga que se distinguiu na magistratura
e na advocacia, Allan Kardec (Hippolyte Léon Denizard Rivail) não seguiu essas carreiras.
Desde
a primeira juventude, sentiu-se inclinado ao estudo das ciências e da
filosofia.
Educado
na Escola de Pestalozzi, em Yverdun (Suíça), tornou-se um dos mais eminentes
discípulos desse célebre professor e um dos zelosos propagandistas do seu
sistema de educação, que tão grande influência exerceu sobre a reforma do
ensino na França e na Alemanha.
Foi
nessa escola que lhe desabrocharam as idéias que mais tarde o colocariam na classe
dos homens progressistas e dos livre-pensadores.
Nascido
sob a religião católica, mas educado num país protestante, os atos de intolerância
que por isso teve de suportar, no tocante a essa circunstância, cedo o levaram
a conceber a ideia de uma reforma religiosa, na qual trabalhou em silêncio
durante longos anos com o intuito de alcançar a unificação das crenças.
Faltava-lhe, porém, o elemento indispensável à solução desse grande problema.
O
Espiritismo veio, a seu tempo, imprimir-lhe especial direção aos trabalhos.
Concluídos
seus estudos, voltou para a França.
Conhecendo
a fundo a língua alemã, traduzia para a Alemanha diferentes obras de educação e
de moral e, o que é muito característico, as obras de Fénelon, que o tinham
seduzido de modo particular.
Era
membro de várias sociedades sábias, entre outras, da Academia Real de Arras,
que, em o concurso de 1831, lhe premiou uma notável memória sobre a seguinte
questão:
Qual
o sistema de estudos mais de harmonia com as necessidades da época?
De
1835 a 1840, fundou, em sua casa, à rua de Sèvres, cursos gratuitos de Química,
Física, Anatomia comparada, Astronomia, etc., empresa digna de encômios em
todos os tempos, mas, sobretudo, numa época em que só um número muito reduzido
de inteligências ousava enveredar por esse caminho.
Entre
as suas numerosas obras de educação, podem ser citadas: Plano proposto para melhoramento
da Instrução pública (1828); Curso prático e teórico de Aritmética, segundo o método
Pestalozzi, para uso dos professores e das mães de família (1824); Gramática
francesa clássica (1831); Manual dos exames para os títulos de capacidade;
Soluções racionais das questões e problemas de Aritmética e de Geometria
(1846); Catecismo gramatical da língua francesa (1848); Programa dos cursos
usuais de Química, Física, Astronomia, Fisiologia, que ele professava no Liceu Polimático;
Ditados normais dos exames da Municipalidade e da Sorbona, seguidos de Ditados
especiais sobre as dificuldades ortográficas (1849), obra muito apreciada na
época do seu aparecimento e da qual ainda recentemente eram tiradas novas edições.
Antes
que o Espiritismo lhe popularizasse o pseudônimo de Allan Kardec, já ele se ilustrara,
como se vê, por meio de trabalhos de natureza muito diferente, porém tendo
todos, como objetivo, esclarecer as massas e prendê-las melhor às respectivas
famílias e países.
Pelo
ano de 1855, posta em foco a questão das manifestações dos Espíritos, Allan Kardec
se entregou a observações perseverantes sobre esse fenômeno, cogitando
principalmente de lhe deduzir as conseqüências filosóficas.
Entreviu,
desde logo, o princípio de novas leis naturais:
as que regem as relações entre o mundo visível e o mundo invisível.
Reconheceu,
na ação deste último, uma das forças da Natureza, cujo conhecimento haveria de
lançar luz sobre uma imensidade de problemas tidos por insolúveis, e lhe compreendeu
o alcance, do ponto de vista religioso.
Suas
obras principais sobre esta matéria são: O Livro dos Espíritos, referente à
parte filosófica, e cuja primeira edição apareceu a 18 de abril de 1857; O
Livro dos Médiuns, relativo à parte experimental e científica (janeiro de
1861); O Evangelho segundo o Espiritismo, concernente à parte moral (abril de
1864); O Céu e o Inferno, ou A justiça de Deus segundo o Espiritismo (agosto de
1865); A Gênese, os Milagres e as Predições (janeiro de 1868); A Revista
Espírita, jornal de estudos psicológicos, periódico mensal começado a 1º de
janeiro de 1858.
Fundou
em Paris, a 1º de abril de 1858, a primeira Sociedade espírita regularmente constituída,
sob a denominação de Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, cujo fim exclusivo
era o estudo de quanto possa contribuir para o progresso da nova ciência.
Allan
Kardec se defendeu, com inteiro fundamento, de coisa alguma haver escrito
debaixo da influência de idéias preconcebidas ou sistemáticas. Homem de caráter
frio e calmo, observou os fatos e de suas observações deduziu as leis que os
regem. Foi o primeiro a apresentar a teoria relativa a tais fatos e a formar
com eles um corpo de doutrina, metódico e regular.
Demonstrando
que os fatos erroneamente qualificados de sobrenaturais se acham submetidos a
leis, ele os incluiu na ordem dos fenômenos da Natureza, destruindo assim o último
refúgio do maravilhoso e um dos elementos da superstição.
Durante
os primeiros anos em que se tratou de fenômenos espíritas, estes constituíram antes
objeto de curiosidade, do que de meditações sérias.
O
Livro dos Espíritos fez que o assunto fosse considerado sob aspecto muito
diverso.
Abandonaram-se
as mesas girantes, que tinham sido apenas um prelúdio, e começou-se a atentar
na doutrina, que abrange todas as questões de interesse para a Humanidade.
Data
do aparecimento de O Livro dos Espíritos a fundação de Espiritismo que, até então,
só contara com elementos esparsos, sem coordenação, e cujo alcance nem toda
gente pudera apreender.
A
partir daquele momento, a doutrina prendeu a atenção de homens sérios e tomou
rápido desenvolvimento.
Em poucos anos, aquelas idéias conquistaram numerosos aderentes
em todas as camadas sociais e em todos os países.
Esse
êxito sem precedentes decorreu sem dúvida da simpatia que tais idéias
despertaram, mas também é devido, em grande parte, à clareza com que foram
expostas e que é um dos característicos dos escritos de Allan Kardec.
Evitando
as fórmulas abstratas da Metafísica, ele soube fazer que todos o lessem sem fadiga,
condição essencial à vulgarização de uma idéia.
Sobre
todos os pontos controversos, sua argumentação, de cerrada lógica, poucas
ensanchas oferece à refutação e predispõe à convicção.
As
provas materiais que o Espiritismo apresenta da existência da alma e da vida
futura tendem a destruir as idéias materialistas e panteístas.
Um
dos princípios mais fecundos dessa doutrina e que deriva do precedente é o da
pluralidade das existências, já entrevisto por uma multidão de filósofos
antigos e modernos e, nestes últimos tempos, por João Reynaud, Carlos Fourier, Eugênio
Sue e outros. Conservara-se, todavia, em estado de hipótese e de sistema,
enquanto o Espiritismo lhe demonstrara a realidade e prova que nesse princípio
reside um dos atributos essenciais da Humanidade.
Dele
promana a explicação de todas as aparentes anomalias da vida humana, de todas as desigualdades
intelectuais, morais e sociais, facultando ao homem saber donde vem, para onde
vai, para que fim se acha na Terra e por que aí sofre.
As
idéias inatas se explicam pelos conhecimentos adquiridos nas vidas anteriores;
a marcha dos povos e da Humanidade, pela ação dos homens dos tempos idos e que
revivem, depois de terem progredido; as simpatias e antipatias, pela natureza
das relações anteriores.
Essas
relações, que religam a grande família humana de todas as épocas, dão por base,
aos grandes princípios de fraternidade, de igualdade, de liberdade e de
solidariedade universal, as próprias leis da Natureza e não mais uma simples
teoria.
Em
vez da fé cega, que anula a liberdade de pensar, ele diz:
Não
há fé inabalável, senão a que pode encarar face a face a razão, em todas as
épocas da Humanidade.
A
fé, uma base se faz necessária e essa base é a inteligência perfeita daquilo em
que se tem de crer.
Para crer, não basta ver, é preciso,
sobretudo, compreender.
A
fé cega já não é para este século.
É
precisamente ao dogma da fé cega que se deve o ser hoje tão grande o número de
incrédulos, porque ela quer impor-se e exige a abolição de uma das mais preciosas
faculdades do homem: o raciocínio e o livre-arbítrio.
Trabalhador
infatigável, sempre o primeiro a tomar da obra e o último a deixá-la, Allan Kardec
sucumbiu, a 31 de março de 1869, quando se preparava para uma mudança de local,
imposta pela extensão considerável de suas múltiplas ocupações.
Diversas
obras que ele estava quase a terminar, ou que aguardavam oportunidade para vir
a lume, demonstrarão um dia, ainda mais, a extensão e o poder das suas
concepções.
Já
não existe o homem.
Entretanto, Allan Kardec é imortal e a sua
memória, seus trabalhos, seu Espírito estarão sempre com os que empunharem
forte e vigorosamente o estandarte que ele soube sempre fazer respeitado.
Uma
individualidade pujante constituiu a obra.
Era
o guia e o fanal de todos.
Na
Terra, a obra subsistirá o obreiro.
Os
crentes não se congregarão em torno de Allan Kardec; congregarse-ão em torno do
Espiritismo, tal como ele o estruturou e, com os seus conselhos, sua influência,
avançaremos, a passos firmes, para as fases ditosas prometidas à Humanidade regenerada.
Fonte:
Obras Póstumas.
Referência
FEDERAÇÃO
ESPÍRITA BRASILEIRA. BIOGRAFIA DE ALLAN KARDEC. Disponível em http://www.febnet.org.br/wp-content/uploads/2012/06/Allan-Kardec.pdf.
Acesso 02 OUT 2017.
Amèlie Gabrielle Boudet
Madame
Rivail : Sra. Allan Kardec
Nasceu em Thiais, cidade do menor e mais populoso
Departamento francês – o Sena, aos 2 do Frimário do ano IV, segundo o
Calendário Republicano então vigente na França, e que corresponde a 23 de
Novembro de 1795.
Filha
de Julien-Louis Boudet, proprietário e antigo tabelião, homem portanto bem
colocado na vida, e de Julie-Louise Seigneat de Lacombe, recebeu, na pia
batismal o nome de Amélie Gabrielle Boudet.
A
menina Amélie, filha única, aliando desde cedo grande vivacidade e forte
interesse pelos estudos, não foi um problema para os pais, que, a par de fina
educação moral, lhe proporcionaram apurados dotes intelectuais.
Após
cursar o colégio primário, estabeleceu-se em Paris com a família, ingressando
numa Escola Normal, de onde saiu diplomada em professora de 1ª . classe.
Revela-nos
o Dr. Canuto de Abreu que a senhorinha Amélie também foi professora de Letras e
Belas Artes, trazendo de encarnações passadas a tendência inata, por assim
dizer, para a poesia e o desenho.
Culta
e inteligente, chegou a dar à luz três obras, assim nomeadas: “Contos Primaveris”,
1825; “Noções de Desenho”, 1826; “O Essencial em Belas Artes”, 1828.
Vivendo
em Paris, no mundo das letras e do ensino, quis o Destino que um dia a Srta.
Amélie Boudet deparasse com o Professor Hippolyte Denizard Rivail.
De
estatura baixa, mas bem proporcionada, de olhos pardos e serenos, gentil e
graciosa, vivaz nos gestos e na palavra, denunciando inteligência admirável,
Amélie Boudet, aliando ainda a todos esses predicados um sorriso terno e
bondoso, logo se fez notar pelo circunspecto Prof. Rivail, em quem reconheceu,
de imediato, um homem verdadeiramente superior, culto, polido e reto.
Em
6 de Fevereiro de 1832, firmava-se o contrato de casamento.
Amélie
Boudet, tinha nove anos mais que o Prof. Rivail, mas tal era a sua jovialidade
física e espiritual, que a olhos vistos aparentava a mesma idade do marido.
Jamais essa diferença constituiu entrave à felicidade de ambos.
Pouco
tempo depois de concluir seus estudos com Pestalozzi, no famoso castelo suíço
de Zahringen (Yverdun), o Prof. Rivail fundara em Paris um Instituto Técnico,
com orientação baseada nos métodos pestalozzianos.
Madame Rivail associou-se ao
esposo na afanosa tarefa educacional que ele vinha desempenhando no referido
Instituto havia mais de um lustro.
Grandemente
louvável era essa iniciativa humana e patriótica do Prof. Rivail, pois, não
obstante as leis sucessivas decretadas após a Revolução Francesa em prol do
ensino, a instrução pública vivia descurada do Governo, tanto que só em 1833, pela
lei Guizot, é que oficial e definitivamente ficaria estabelecido o ensino
primário na França.
Em
1835, o casal sofreu doloroso revés. Aquele estabelecimento de ensino foi
obrigado a cerrar suas portas e a entrar em liquidação.
Possuindo,
porém, esposa altamente compreensiva, resignada e corajosa, fácil lhe foi
sobrepor-se a esses infaustos acontecimentos.
Amparando-se
mutuamente, ambos se lançaram a maiores trabalhos.
Durante
o dia, enquanto Rivail se encarregava da contabilidade de casas comerciais, sua
esposa colaborava de alguma forma na preparação dos cursos gratuitos que haviam
organizado na própria residência, e que funcionaram de 1835 a 1840.
À
noite, novamente juntos, não se davam a descanso justo e merecido, mas
improdutivo.
O
problema da instrução às crianças e aos jovens tornara-se para Prof. Rivail,
como o fora para seu mestre Pestalozzi, sempre digno da maior atenção.
Por
isso, até mesmo as horas da noite ele as dividia para diferentes misteres relacionados
com aquele problema, recebendo em todos a cooperação talentosa e espontânea de
sua esposa.
Além
de escrever novas obras de ensino, que, aliás, tiveram grande aceitação, o
Prof. Rivail realizava traduções de obras clássicas, preparava para os cursos
de Lévi-Alvarès, freqüentados por toda a juventude parisiense do bairro de São
Germano, e se dedicava ainda, em dias certos da semana, juntamente com sua
esposa, a professorar as matérias estatuídas para os já referidos cursos
gratuitos.
“Aquele que encontrar
uma mulher boa, encontrará o bem e achará gozo no Senhor” - disse Salomão.
Amélie Boudet era dessas mulheres boas, nobres
e puras, e que, despojadas das vaidades mundanas, descobrem no matrimônio
missões nobilitantes a serem desempenhadas.
Nos
cursos públicos de Matemáticas e Astronomia que o Prof. Rivail bi-semanalmente
lecionou, de 1843 a 1848, e aos quais assistiram não só alunos, que também
professores, no “Liceu Polimático” que fundou
e dirigiu até 1850, não faltou em tempo algum o auxilio eficiente e constante
de sua dedicada consorte.
Todas
essas realizações e outras mais, a bem do povo, se originaram das palestras
costumeiras entre os dois cônjuges, mas, como salientou a Condessa de Ségur,
deve-se principalmente à mulher, as inspirações que os homens concretizam.
No
que toca à Madame Rivail, acreditamos que em muitas ocasiões, além de
conselheira, foi ela a inspiradora de vários projetos que o marido pôs em
execução.
Aliás,
é o que nos confirma o Sr. P. J. Leymarie ( que com ambos privara ) ao declarar
que Kardec tinha em grande consideração as opiniões de sua esposa.
Graças
principalmente às obras pedagógicas do professor Rivail, adotadas pela própria
Universidade de França, e que tiveram sucessivas edições, ele e senhora
alcançaram uma posição financeira satisfatória.
O
nome Denizard Rivail tornou-se conhecido nos meios cultos e além do mais
bastante respeitado.
Estava
aberto para ele o caminho da riqueza e da glória, no terreno da Pedagogia.
Sobrar-lhe-ia,
agora, mais tempo para dedicar-se à esposa, que na sua humildade e elevação de espírito
jamais reclamara coisa alguma.
A
ambos, porém, estava reservada uma missão, grandiosa pela sua importância
universal, mas plena de exaustivos trabalhos e dolorosos espinhos.
O
primeiro toque de chamada verificou-se em 1854, quando o Prof. Rivail foi
atraído para os curiosos fenômenos das “mesas girantes”, então em voga no Mundo
todo.
Outros
convites do Além se seguiram, e vemos, em meados de 1855, na casa da Família
Baudin, o Prof. Rivail iniciar os seus primeiros estudos sérios sobre os
citados fenômenos, entrevendo, ali, a
chave do problema que durante milênios viveu na obscuridade.
Acompanhando
o esposo nessas investigações, era de se ver a alegria emotiva com que ela
tomava conhecimento dos fatos que descerravam para a Humanidade novos
horizontes de felicidade.
Após observações e experiências inúmeras, o
professor Rivail pôs mãos à maravilhosa obra da Codificação, e é ainda de sua
cara consorte, então com 60 anos, que ele recebe todo o apoio moral nesse
cometimento.
Tornou-se
ela verdadeira secretária do esposo, secundando-o nos novos e bem mais árduos
trabalhos que agora lhe tomavam todo o tempo, estimulando-o, incentivando-o no
cumprimento de sua missão.
Sem
dúvida, os espíritas, muito devemos a Amélie Boudet e estamos de acordo com o
que acertadamente escreveu Samuel Smiles: os supremos atos da mulher geralmente
permanecem ignorados, não saem à luz da admiração do mundo, porque são feitos
na vida privada, longe dos olhos do público, pelo único amor do bem.
O
nome de Madame Rivail enfileira-se assim, com muita justiça, entre os de
inúmeras mulheres que a História registrou como dedicadas e fiéis colaboradoras
dos seus esposos, sem as quais talvez eles não levassem a termo as suas
missões.
Tais foram, por exemplo, as valorosas esposas de Lavoisier, de
Buckland, de Flaxman, de Huber, de Sir William Hamilton, de Stuart Mill, de
Faraday, de Tom Hood, de Sir Napier, de Pestalozzi, de Lutero, e de tantos
outros homens de gênio.
A
todas essas Grandes Mulheres, além daquelas muito esquecidas pela História, a
Humanidade é devedora eterna!
Lançado
O Livro dos Espíritos, da lavra de Allan Kardec, pseudônimo que tomou o Prof. Rivail,
este, meses depois, a 1º . de Janeiro de 1858, com o apoio tão somente de sua
esposa, deu a lume o primeiro número da “Revue Spirite”, periódico que alcançou
mais de um século de existência grandemente benéfica ao Espiritismo.
Havia
cerca de seis meses que na residência do casal Rivail, então situada à Rua dos
Mártires n. 8, se efetuavam sessões bastante concorridas, exigindo da parte de
Madame Rivail uma série de cuidados e atenções, que por vezes a deixavam
extenuada.
O
local chegou a se tornar apertado para o elevado número de pessoas que ali
compareciam, de sorte que em Abril de 1858 Allan Kardec fundava, fora do seu lar,
a “Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas”.
Mais
uma obra de grave responsabilidade!
Tomar
tais iniciativas naquela recuada época, em que o despotismo clerical ainda
constituía uma força, não era tarefa para muitos.
Havia
necessidade de larga dose de devotamento, firmeza de vistas e verdadeiro
espírito de sacrifício.
Ao
casal Rivail é que coube, apesar de todos os escolhos e perigos que se lhe
deparariam em a nova estrada, empreender, com a assistência e proteção do Alto,
a maior revolução de idéias de que se teve notícia nos meados do século XIX.
Allan
Kardec foi alvo do ódio, da injúria, da calúnia, da inveja, do ciúme e do
despeito de inimigos gratuitos, que a todo custo queriam conservar a luz sob o
alqueire.
Intrigas,
traições, insultos, ingratidões, tudo de mal cercou o ilustre reformador, mas
em todos os momentos de provas e dificuldades sempre encontrou, no terno afeto
de sua nobre esposa, amparo e consolação, confirmando-se essas palavras de
Simalen:
“A mulher é a estrela
de bonança nos temporais da vida.”
Com
vasta correspondência epistolar, proveniente da França e de vários outros
países, não fosse a ajuda de sua esposa nesse setor, sem dúvida não sobraria
tempo para Allan Kardec se dedicar ao preparo dos livros da Codificação e de
sua revista.
Uma
série de viagens ( em 1860, 1861, 1862, 1864, etc, ) realizou Kardec,
percorrendo mais de vinte cidades francesas, além de várias outras da Suíça e
da Bélgica, em todas semeando as idéias espíritas.
Sua
veneranda consorte, sempre que suas forças lhe permitiam, acompanhou-o em
muitas dessas viagens, cujas despesas, cumpre informar, corriam por conta do
próprio casal.
Parafraseando
o escritor Carlyle, poder-se-ia dizer que Madame Allan Kardec, pelo espaço de
quase quarenta anos, foi a companheira amante e fiel do seu marido, e com seus
atos e suas palavras sempre o ajudou em tudo quanto ele empreendeu de digno e
de bom.
Aos
31 de Março de 1869, com 65 anos de idade, desencarnava, subitamente, Allan
Kardec, quando ultimava os preparativos para a mudança de residência.
Foi
uma perda irreparável para o mundo espiritista, lançando em consternação a
todos quantos o amaram.
Madame
Allan Kardec, quer partilhara com admirável resignação as desilusões e os infortúnios
do esposo, agora, com os cabelos nevados pelos seus 74 anos de existência e a
alma sublimada pelos ensinos dos Espíritos do Senhor, suportaria qualquer
realidade mais dura. Ante a partida do querido companheiro para a
Espiritualidade, portou-se como verdadeira espírita, cheia de fé e estoicismo,
conquanto, como é natural, abalada no profundo do ser.
No
cemitério de Montmartre, onde, com simplicidade, aos 2 de Abril se realizou o
sepultamento dos despojos do mestre, comparecia uma multidão de mais de mil
pessoas.
Discursaram
diversos oradores, discípulos dedicados de Kardec, e por último o Sr. E. Muller,
que logo no princípio do seu elogio fúnebre ao querido extinto assim se
expressou:
“Falo em nome de sua viúva, da qual lhe foi companheira fiel e
ditosa durante trinta e sete anos de felicidade sem nuvens nem desgostos, daquela
que lhe compartiu as crenças e os trabalhos, as vicissitudes e as alegrias, e
que se orgulhava da pureza dos costumes, da honestidade absoluta e do
desinteresse sublime do esposo; hoje, sozinha, é ela quem nos dá a todos o
exemplo de coragem, de tolerância, do
perdão das injúrias e do dever escrupulosamente cumprido.”
Madame
Allan Kardec recebeu da França e do estrangeiro, numerosas e efusivas
manifestações de simpatia e encorajamento, o que lhe trouxe novas forças para o
prosseguimento da obra do seu amado esposo.
Desejando
os espiritistas franceses perpetuar num monumento o seu testemunho de profundo
reconhecimento à memória do inesquecível mestre, consultaram nesse sentido a
viúva, que, sensibilizada com aqueles desejos humanos mas sinceros, anuiu,
encarregando desde logo uma comissão para tomar as necessárias providências.
Obedecendo
a um desenho do Sr. Sebille, foi então levantado no cemitério do Père-Lachaise um
dólmen, constituído de três pedras de granito puro, em posição vertical, sobre
as quais se colocou uma quarta pedra, tabular, ligeiramente inclinada, e
pesando seis toneladas.
No interior deste dólmen, sobre uma coluna também de
pedra, fixou-se um busto, em bronze, de Kardec.
Esta
nova morada dos despojos mortais do Codificador foi inaugurada em 31 de Março
de 1870 , e nessa ocasião o Sr. Levent, vicepresidente da “Sociedade Parisiense
de Estudos Espíritas”, discursou, a pedido de Madame Allan Kardec, em nome dela
e dos amigos.
Cerca
de dois meses após o decesso do excelso missionário de Lyon, sua esposa, no
desejo louvável de contribuir para a realização dos plano futuros que ele
tivera em mente, e de cujas obras, revista e Livraria passou a ser a única
proprietária legal, houve por bem, no interesse da Doutrina, conceder todos os
anos certa verba para uma “Caixa Geral do Espiritismo”, cujos fundos seriam
aplicados na aquisição de propriedades, a fim de que pudessem ser remediadas
quaisquer eventualidades futuras.
Outras
sábias decisões foram por ela tomadas no sentido de salvaguardar a propaganda
do Espiritismo, sendo, por isso, bastante apreciado pelos espíritas de todo o Mundo
o seu nobre desinteresse e devotamento.
Apesar
de sua avançada idade, Madame Allan Kardec demonstrava um espírito de trabalho
fora do comum, fazendo questão de tudo gerir pessoalmente, cuidando de assuntos
diversos, que demandariam várias cabeças.
Além
de comparecer à reuniões, para as quais era convidada, todos os anos presidia à
belíssima sessão em que se comemorava o Dia dos Mortos, e na qual, após vários
oradores mostrarem o que em verdade significa a morte à luz do Espiritismo,
expressivas comunicações de Espíritos
Superiores eram recebidas por diversos médiuns.
Se
Madame Allan Kardec – conforme se lê em Revue Spirite de 1869 – se entregasse
ao seu interesse pessoal, deixando que as coisas andassem por si mesmas e sem
preocupação de sua parte, ela facilmente poderia assegurar tranqüilidade e
repouso à sua velhice.
Mas,
colocando-se num ponto de vista superior, e guiada, além disso, pela certeza de
que Allan Kardec com ela contava para prosseguir, no rumo já traçado, a obra moralizadora
que lhe foi objeto de toda a solicitude durante os últimos anos de vida, Madame
Allan Kardec não hesitou um só instante.
Profundamente
convencida da verdade dos ensinos espíritas, ela buscou garantir a vitalidade
do Espiritismo no futuro, e, conforme ela mesma o disse, melhor não saberia
aplicar o tempo que ainda lhe restava na Terra, antes de reunir-se ao esposo.
Esforçando-se
por concretizar os planos expostos por Allan Kardec em “Revue Spirite” de 1868,
ela conseguiu, depois de cuidadosos estudos feitos conjuntamente com alguns dos
velhos discípulos de Kardec, fundar a “Sociedade Anônima do Espiritismo”.
Destinada
à vulgarização do Espiritismo por todos os meios permitidos pelas leis, a
referida sociedade tinha, contudo, como fito principal, a continuação da “Revue
Spirite”, a publicação das obras de Kardec
e bem assim de todos os livros que tratassem do Espiritismo.
Graças,
pois, à visão, ao empenho, ao devotamento sem limites de Madame Allan Kardec, o
Espiritismo cresceu a passos de gigante, não só na França, que também no Mundo
todo.
Estafantes
eram os afazeres dessa admirável mulher, cuja idade já lhe exigia repouso
físico e sossego de espírito. Bem cedo, entretanto, os Céus a socorreram. O Sr.
P. G. Leymarie, um dos mais fervorosos discípulos de Kardec desde 1858, médium,
homem honesto e trabalhador incansável, assumiu em 1871 a gerência da Revue
Spirite e da Livraria, e logo depois, com a renúncia dos companheiros de administração
da sociedade anônima, sozinho tomou sob os ombros os pesados encargos da direção.
Daí
por diante, foi ele o braço direito de Madame Allan Kardec, sempre acatando com
respeito as instruções emanadas da venerável anciã, permitindo que ela
terminasse seus dias em paz e confiante no progresso contínuo do Espiritismo.
Parecendo
muito comercial, aos olhos de alguns espíritas puritanos, o título dado à
Sociedade, Madame Allan Kardec, que também
nunca simpatizara com esse título, mas que o aceitara por causa de
certas conveniências, resolveu, na assembléia geral de 18 de Outubro de 1873, dar-lhe
novo nome: “Sociedade para a Continuação das Obras Espíritas de Allan Kardec”,
satisfazendo com isso a gregos e troianos.
Muito
ainda fez essa extraordinária mulher a prol do Espiritismo e de todos quantos
lhe pediam um conselho ou uma palavra de consolo, até que em 21 de Janeiro de
1883, às 5 horas da madrugada, docemente, com rara lucidez der espírito, com
aquele mesmo gracioso e meigo sorriso que sempre lhe brincava nos lábios, desatou-se
dos últimos laços que a prendiam à matéria.
A
querida velhinha tinha então 87 anos, e nessa idade, contam os que a
conheceram, ainda lia sem precisar de óculos e escrevia ao mesmo tempo
corretamente e com letra firme.
Aplicando-lhe
as expressões de célebre escritor, pode-se dizer, sem nenhum excesso, que “sua
existência inteira foi um poema cheio de coragem, perseverança, caridade e
sabedoria”.
Compreensível,
pois, era a consternação que atingiu a família espírita em todos os quadrantes
do globo.
De
acordo com o seus próprios desejos, o enterro de Madame Allan Kardec foi
simples e espiriticamente realizado, saindo o féretro de sua residência, na
Avenida e Vila Ségur n. 39, para o Père-Lachaise, a 12 quilômetros de
distância.
Grande
multidão, composta de pessoas humildes e de destaque, compareceu em 23 de
Janeiro às exéquias junto ao dólmen de Kardec, onde os despojos da velhinha
foram inumados e onde todos os anos, até à sua desencarnação, ela compareceu às
solenidades de 31 de março.
Na
coluna que suporta o busto do Codificador foram depois gravados, à esquerda,
esses dizeres em letras maiúsculas: AMÈLIE GABRIELLE BOUDET – VEUVE ALLAN
KARDEC – 21 NOVEMBRE 1795 – 21 JANVIER 1883.
No
ato do sepultamento falaram os Srs. P.G. Leymarie, em nome de todos os
espíritas e da “Sociedade para a Continuação das Obras Espíritas de Allan
Kardec”, Charles Fauvety, ilustre escritor e presidente da “Sociedade
Científica de Estudos Psicológicos”, e bem assim representantes de outras
Instituições e amigos, como Gabriel Delanne, Cot, Carrier, J. Camille
Chaigneau, poeta e escritor, Lecoq, Georges Cochet, Louis Vignon, que dedicou
delicados versos à querida extinta, o Dr. Josset e a distinta escritora, a Sra.
Sofia Rosen-Dufaure, todos fazendo sobressair
os reais méritos daquela digna sucessora de Kardec.
Por
fim, com uma prece feita pelo Sr. Warroquier, os presentes se dispersaram em
silêncio.
A
nota mais tocante daquelas homenagens póstumas foi dada pelo Sr. Lecoq.
Leu
ele, para alegria de todos, bela comunicação mediúnica de Antonio de Pádua,
recebida em 22 de Janeiro, na qual esse iluminado Espírito descrevia a
brilhante recepção com que elevados Amigos do Espaço, juntamente com Allan
Kardec, acolheram aquele ser bem aventurado.
No
improviso do Sr. P.G. Leymarie, este relembrou, em traços rápidos, algo da vida
operosa da veneranda extinta, da sua nobreza d'alma, afirmando, entre outras
coisas, que a publicação tanto de O Livro dos Espíritos, quanto da Revue
Spirite, se deveu em grande parte à firmeza de ânimo,
à insistência, à perseverança de Madame Allan Kardec.
Não
deixando herdeiros diretos, pois que não teve filhos, por testamento fez ela
sua legatária universal a “Sociedade para Continuação das Obras Espíritas de
Allan Kardec”.
Embora
uma parenta sua, já bem idosa, e os filhos desta intentassem anular essas
disposições testamentárias, alegando que ela não estava em perfeito juízo,
nada, entretanto, conseguiram, pois as provas em contrário foram esmagadoras.
Em
26 de Janeiro de 1883, o conceituado médium parisiense Sr. E. Cordurié recebia
espontaneamente uma mensagem assinada pelo Espírito de Madame Allan Kardec,
logo seguida de outra, da autoria de seu esposo. Singelas na forma, belas nos
conceitos, tinham ainda um sopro de imortalidade e comprovavam que a vida
continua...
Fonte:
WANTUIL, Zêus, Grandes Espíritas do Brasil, p. 51
Referência
FEDERAÇÃO
ESPÍRITA BRASILEIRA. BIOGRAFIA DE AMÈLIE GABRIELLE BOUDET. Disponível em http://www.febnet.org.br/wp-content/uploads/2012/06/Amelie-Gabrielle-Boudet.pdf
Acesso 02 OUT 2017.
Caros Amigos e Leitores , a gratidão que tenho a Allan Kardec e a sua venerável esposa Amèlie Gabrielle Boudet , a Doce Gaby, é tão grande , pela obra que legaram a humanidade , que não poderia me furtar em homenageá-la, nesta data tão significativa para a Doutrina Espírita, em que homenageamos Allan Kardec pelos 213 anos de seu nascimento.
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