ALMAS SEM FÉ
Cornélio Pires
Em carta, você pergunta,
Meu caro Antônio Peri,
De que modo almas sem fé
Costumam viver aqui.
Diz você "almas sem fé."
E a sua definição
Faz com que a gente medite
Nos assuntos tais quais são.
A você posso afirmar
De quanto agora conheço:
Cada qual, depois da morte,
Procura o próprio endereço.
Quem se dedica a elevar-se
No campo do dia-a-dia,
Vive no Além pela fé
No trabalho a que servia.
Mas quem anda mundo afora,
sem ideal ou sem crença,
Na Terra ou fora da Terra,
Está naquilo que pensa.
Nesse caso, vale pouco
A morte por nova estrada,
A mente em desequilíbrio
Continua alucinada.
Quem viveu só para si
Segue essa linha incorreta
E é tanta gente no embrulho
Que eu mesmo fico pateta.
Você recorda o João Panca
No Roçado da Parede,
Desencarnado em preguiça
Vive atolado na rede.
Garimpeiro apaixonado,
Manoelino de Nhá Chica,
Sem corpo, mora na serra,
Caçando mina de mica.
Tanto pensava em comida
Que Altino de ista Bela,
No Além, traçou na cabeça
A forma de uma panela.
Bebedor como ninguém,
Nosso Anselmo Rosmaninho
Já morreu, há muito tempo,
E está no copo de vinho.
Sempre parada no ouro,
desencarnou Dona Rita,
Está sem corpo, há dez meses,
E a pobre não acredita.
Conquistador, morreu Nico,
Hoje, ao fazer-se presente,
Ele ataca de fantasma
E as moças correm na frente.
Tanto buscava adorar-se
Que Esmeraldina Botelho,
Depois de desencarnada,
Não larga a face do espelho.
Sem esforço em que progrida,
Tal qual por aqui se vê,
É muita gente que vive
Sem saber como e porquê...
A vida sem ideal
É trilha na contramão,
Dificuldade e perigo
Seguindo sem direção.
Use o carro de seu corpo,
Servindo e amando com fé.
Quem age e confia em Deus
Não precisa marcha à ré.
XAVIER, Francisco Cândido pelo Espírito Cornélio Pires, Baú de casos. São Paulo: Ideal, p.9-10
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